18
Anos
Maioridade sem tempo
Foram dois os editoriais que escrevi aquando da primeira edição da Egoísta: o primeiro, de celebração, qual certidão de nascimento; o segundo, de pesar, qual termo incerto de um óbito sem data na certidão...
Guardei esse na gaveta e eis que o tempo lhe exauriu a validade.
Pois, que, volvidos 18 anos de publicação, resta-me concluir que falhei na premonição...
E hesito em afirmar que estes 18 anos correspondam à idade adulta da Egoísta.
Ela que, de tão precoce na tenra idade, quase diria ter nascido adulta, apta a enfrentar, da vida, o infausto das agruras, os dilemas da incompreensão.
Por coragem ou imprudência - as sempre por convicção -, dedicou-se às Artes e à Cultura: vereda estreita essa, a percorrer em Portugal, qual tortuoso trilho escasso em auspícios de longevidade...
Mas eis que logrou o improvável: de revista temática, guindou-se a 2objecto de culto", sinónimo de um percurso ímpar que a distingue de todas as demais publicações do panorama nacional e, quiçá, internacional.
Quase num ápice, a Egoísta tornou-se incontornável, uma marca fortíssima do Grupo Estoril-Sol, mobilizando artistas, escritores e políticos dentro e fora do País, transformando leitores em coleccionadores, consagrando-se com 81 prémios, nacionais e internacionais, e alcançando esse patamar único de ser a revista europeia mais premiada de todos os tempos!
Talvez por isso tenha merecido a honra de ser exposta no Museu do Louvre, qual ícone de excelência no grafismo do século XXI.
Essa é a conquista de uma equipa de qualidade extrema., tão reduzida quão empenhada. Equipa em que pontua a sua editora, Patrícia Reis, um ser humano de excepção, exuberante em criatividade, culto da diferença, persistência inabalável. Uma escritora de méritos firmados mas, mais que tudo, uma Amiga!
Enquanto editora, de tão profícuo o seu engenho, pouco mais me sobra senão analisar orçamentos, escolher novos temas, dar palpites sobre futuras capas, escrever editoriais...
Enquanto Amiga, persistimos em confundir trabalho com diversão: partilhamos anseios, frustrações e, inevitávelmente, resvalamos para o tema da Egoísta, sabendo que a perfeição não é humana, pois, se o fosse, nunca seria perfeita.
E em lúdica cumplicidade, descobrimos, aos 18 anos, que a Egoísta, afinal, também tem os seus caprichos: não se dá bem com a Internet e tentar o acasalamento seria divórcio certo por inconformidade de génios e incompatibilidade genética.
De facto, como plasmar, no universo digital, essa inconfundível percepção táctil da suave rugosidade do seu papel, desse lettering extraído de uma Olivetti dos anos 50, daquele odor a tinta gráfica, daqueles cortes que espreitam a essência da página que se lhe segue e convidam à reflexão daquela que a antecedeu?
Insólito paradoxo esse, o da Egoísta: autoconfinada às amarras da edição gráfica, ela que nasceu para rasgar fronteiras de modernidade, ela que persiste em fiel apego à memória...
E recordo Carlos Drumond de Andrade: "Ninguém é igual a ninguém. Todo o ser humano é um estranho ímpar".
Não que seja humana a Egoísta. Mas, não o sendo, aprendeu da Humanidade que todo o ser nasce ungido por um ADN, qual cromossoma único que lhe impõe o poder/dever de assumir a diferença.
Esse, o segredo da Egoísta: a vocação da imparidade, na singular estranheza de ser criadora e criatura da sua própria diferença.
Talvez por isso, sem idade; como se nascesse em cada edição; como se cada agora lhe prometesse o futuro.
Assim é a Egoísta: desprendida do passado, liberta da servidão ao tempo...
Disse Eduardo Lourenço: "Somos hóspedes do instante, cada um de nós, mas sempre com o sentimento de que cada instante não é diferente do que chamamos de eternidade, como uma colecção de instantes.
O tempo é feito desses instantes, de nada e de tudo ao mesmo tempo".
Que seja, pois, o porvir essa colecção de instantes, em busca da eternidade.
Instantes do nada, como lições de experiência, instantes do tudo, como ensejos de humildade...
Pois que o tempo, sábio mestre, dita o percurso mutável para a perenidade imutável.
Como uma equação para a vida: a de um tempo, o de agora, que é medida do presente, a que se soma o futuro e se deduz o passado.
Esse, o rumo que nos inspira, matriz de cada edição...
Longa vida à Egoísta!
Tão longa, que já nem seja eu, maduro septuagenário, a ter o tempo de escrever o seu último editorial!
Editorial de Mário Assis Ferreira
A revista “Egoísta” está à venda no Clube IN do Casino Estoril e do Casino Lisboa. A “Egoísta” tem, ainda, uma campanha de assinaturas e está disponível em www.egoista.pt
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